Foto: Imagem ilustrativa |
Quando a estudante de Arquitetura Juliana Almeida, 19 anos, começou a
receber no celular fotos e vídeos sensuais de meninas de Feira de
Santana, foi pega de surpresa. Apesar de morar em Salvador, Juliana
reconheceu algumas garotas da cidade natal. “Conhecia umas três de
vista”.
Ela não foi a única fora (e dentro) de Feira de Santana a receber as
imagens pelo aplicativo de mensagens Whatsapp. Para a câmera do celular,
as jovens revelavam pernas, seios e vagina.
Numa das fotos mais comportadas, uma menina de 13 anos aparece num
conjunto de lingerie branco, com corpete e salto alto. Outra fotografou a
si mesma de pernas abertas, chupando o polegar.
Depois que as fotos correram, não tardou para que todos soubessem como
aquela exibição começou. As garotas não apenas se gravaram, mas também
compartilharam as próprias imagens.
Num dos vídeos, meninas se masturbam diante do espelho. Em outro, uma
adolescente faz sexo com dois garotos de aproximadamente 15 anos. “O que
mais assustou foi que eram meninas com bom nível de informação”,
comentou uma estudante de Direito.
Sexting
Se, por aqui, a autoexibição via celular é relativamente nova, nos
Estados Unidos a prática se popularizou há sete anos. Lá, ficou
conhecida como Sexting, expressão que une as palavras sex (sexo) e
texting (ato de enviar mensagens).
Uma pesquisa divulgada ano passado pela Universidade do Sul da
Califórnia (USC) mostrou que um em cada sete adolescentes americanos já
compartilhou fotos ou vídeos de si mesmo nu ou seminu.
No caso das meninas de Feira, tudo começou entre amigos. “A primeira foi
Maira*. Ela tinha um grupo no Whatsapp com amigas e tirou uma foto
mostrando os peitos”, contou Caio*, 17, referindo-se a uma garota de 13.
A foto de Maira se espalhou. Dias depois, foi criado um grupo maior. “As
meninas tiravam fotos e mandavam para os meninos. Acho que elas ficaram
iludidas, porque tinham caras mais velhos”, observa Caio, que integrou o
grupo - cada vez maior. “Muita menina começou a participar, para ficar
popular”.
Segundo Caio, o grupo chegou a ter 50 membros, o limite do Whatsapp, e
outros grupos foram criados. No troca-troca, as imagens extrapolaram os
grupos.
Foi aí que Laura*, 13, viu uma foto sua exibindo os seios se espalhar na
escola– um colégio particular dirigido por freiras. Ela afirma que
mandou a foto apenas para um garoto que não era seu namorado, mas que é
apontado por ela como o responsável pelo vazamento.
“As meninas começaram com isso (compartilhar imagens), mas depois me
afastei. Mas minha foto não era como as delas. As delas eram muito
pesadas”, comenta. De qualquer forma, Laura teve que devolver aos pais o
iPhone 4.
Ask.FM - Em Salvador, o frisson começou em 2012, com o
crescimento da rede social Ask.fm, onde as pessoas fazem perguntas aos
usuários. Bastava alguém perguntar, na rede social, sobre uma
determinada pessoa, que outro usuário postava uma foto daquela pessoa
sem roupa.
Não dava para apontar o responsável, até que algumas adolescentes
deixaram as publicações anônimas. “Eram elas postando as próprias fotos.
Descobrimos porque a galera começou a guardar as imagens antes que
deletassem”, conta Mateus*, 16.
Mas o Ask.fm logo deu lugar ao Whatsapp e cada vez mais imagens surgiam.
Numa delas, uma estudante de um dos colégios mais caros da capital
baiana se masturba com o salto de um sapato.
Cuidado
O Sexting adolescente é cada vez mais recorrente, segundo a delegada Ana
Crícia Almeida, titular da Delegacia de Repressão a Crimes contra a
Criança e o Adolescente (Derca). Ela, porém, não aponta quantos casos
foram registrados este ano, com pedidos dos pais para tirar as imagens
de circulação.
Segundo Ana Crícia, as imagens são um tipo de pornografia
infanto-juvenil e é preciso cuidado para que o conteúdo não caia nas
mãos de pedófilos. “As meninas estão saindo da infância e não imaginam
que aquilo fica”.
Já a socióloga Celma Borges, professora da Faculdade de Educação (Faced)
da Ufba, aponta uma aspecto psicológico da exibição. “As pessoas querem
o simples aplauso, como o ‘curtir’ do Facebook. Elas se sentam vistas e
talvez tenham algum tipo de alento”.
Entre aplausos e curtidas virtuais, a história pode acabar mal, como
acabou na cidade de Parnaíba, no Piauí, onde a polícia investiga a morte
de Júlia Rebeca, de 17 anos.
A suspeita é que a garota tenha cometido suicídio depois que se espalhou
por todo o Brasil um vídeo que ela mesma filmou, fazendo sexo com um
jovem e outra adolescente. No Twitter, Júlia chegou a se despedir: “Eu
te amo, desculpa não ser a filha perfeita (...) tô com medo mas acho que
é tchau pra sempre”.
*Nomes fictícios
Compartilhar e guardar imagens é crime
Se você receber uma mensagem com imagens sensuais de crianças ou
adolescentes, é melhor deletar. Mesmo que ela tenha sido enviada pela
pessoa exposta, só o fato de ter o arquivo já é um crime, segundo a
delegada Ana Crícia Almeida, titular da Delegacia Especializada de
Repressão a Crimes contra a Criança e o Adolescente (Derca). “Quem está
se expondo não comete o crime, mas sim quem recebe. Pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), a pessoa que adquirir, possuir ou
armazenar esse tipo de imagem pode pegar até quatro anos de reclusão”.
Além disso, nada de sair por aí compartilhando o que chegar pelo
Whatsapp. Divulgar, publicar ou trocar arquivos que se configuram como
pornografia infantojuvenil também é crime e a pena pode variar de três a
seis anos de prisão. Tem mais: segundo o advogado Marcelo Ribeiro,
professor da Ruy Barbosa e da Unifacs, quem divulga o conteúdo sem
autorização também viola artigos do Código Civil. “A pessoa estará
expondo a imagem da outra sem autorização, o que justificaria o
pagamento de indenização”, concluiu.
Internet diminui reflexão, diz psicóloga
Se expor nas redes sociais e via mensagens de celular pode significar necessidade de reconhecimento, na opinião da psicóloga Larissa Ornelas, professora da Uneb. “As garotas veem a possibilidade até de se transformar em celebridade através desse ato de tirar o véu”. Segundo Larissa, as redes sociais contribuem para que os jovens percam a noção dos limites. “Esta instantaneidade diminui a hesitação e a reflexão”.
Para evitar que os filhos se exponham dessa forma nas redes sociais, os
pais devem participar mais dos círculos sociais deles, segundo a
socióloga Celma Borges, professora da Ufba. Ela alerta, ainda, para a
necessidade de diálogo em casa e nas escolas. “É preciso fazer esse
acompanhamento, porque a internet ecoa o que as pessoas não extravasam
normalmente”.
Fonte: Correio
Fonte: Correio
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